EC Brasil Ultra Trail - 90K Visconde de Mauá
O Endurance Challenge é um circuito global da The North Face (TNF) com provas de
excelência comprovada que acontece em vários países do mundo.
Já sendo muito aguardado, neste ano de 2015 foi a
vez do Brasil sediar pela primeira vez este evento internacional.
O estado do Rio de Janeiro foi escolhido para
receber este evento grandioso e o Parque Nacional do Itatiaia (PNI), com o Pico
das Agulhas Negras, deu o nome à
prova, mesmo com o evento tendo sede na cidade vizinha Visconde de Mauá, o principal percurso da prova – 80K – passaria ao lado deste Pico,
levando os corredores a uma altitude superior a 2.600 metros.
O evento foi cercado deixou os atletas ansiosos e
ofereceu as seguintes distâncias:
10K (depois foi substituída por 11K)
21K
50K (minha esposa Nilce correu nesta, sua primeira
Ultramaratona)
80K (claro
que minha prova)
Pouco mais de um mês antes do evento a empresa TRC Brasil (responsável pela
organização da prova) fez um anúncio que surtiu um grande efeito negativo aos
atletas: o percurso de 80K fora impedido de acessar o PNI, segundo alegações do
ICMBio (entidade federal que
regulamenta o uso dos Parques Nacionais). Com isto o percurso de 80K teria que
ser redesenhado fora do PNI e junto ao Parque Estadual da Pedra Selada, onde também já passavam partes dos outros
percursos. Com isto o percurso de 80K perderia além de beleza também qualidade
técnica.
Outro fato que atormentava muitos atletas dos 80K
era o tempo limite da prova, com 15h de corte final e seus três pontos de cortes
(Hard Cutoff) intermediários:
KM 23,9 = 4h20min
KM 38,5 = 6h59min
KM 74,0 = 13h26min
No entanto a organização alegou que era uma regra
global do circuito, por mim tudo bem.
A prova teve todas as inscrições esgotadas rapidamente,
com os seguintes limites:
11K = 500 atletas
21K = 500 atletas
50K = 400 atletas
80K = 300
atletas
Outro grande atrativo também era a premiação em
dinheiro, com R$ 23.000,00 divididos entre os cinco primeiros no geral de ambos
os sexos para os percursos de 50K e 80K, além de ampla distribuição de vouchers
e produtos TNF.
Mapa e Altimetria da prova (registrados em meu GPS)
Para esta competição fiz uma preparação muito aquém do esperado, devido a dois pontos de inflamação no pé direito que acabei
adquirindo antes e durante os 281Km da BR135+, que finalizei em janeiro. Mas é vida que segue e parti feliz para a
prova, após muitas sessões de fisioterapia e sem saber se o pé reagiria bem,
mas aproveitei para ir testar quase todos os equipamentos que vou utilizar na Ultra-Trail du Mont-Blanc (UTMB – 170K) no final de agosto, incluindo meu novo par
de bastões Black Diamond, sendo esta
a primeira vez que usaria um par de bastões full
time numa prova.
Chegando a data da prova partimos para Visconde de
Mauá, juntamente com Nilce (50K) e algumas amigas de Equipe (11K). Retiramos o kit do atleta no dia anterior à prova lá
mesmo em Visconde de Mauá (também tinha opção de retirada nas lojas TNF de algumas capitais). Depois
participamos da Apresentação Técnica da prova.
Retirada de kit na Arena da prova
Apresentação técnica da prova
A prova prometia ser fria, mas o tempo ajudou bem
na semana da competição, que reduziu um pouco o frio.
A Pedra Selada pré-prova, clima excelente!
Após algumas horas de sono parti para a largada,
minha pousada ficava em Maromba, a cerca de 10 Km do pórtico de largada. O
termômetro do meu carro registrava uma temperatura de 10° C, fui agasalhado e
com touca e luvas, mas preferi deixar tudo no carro, só largando com a roupa
que ia usar na prova.
Para entrada no funil de largada foi exigida uma
checagem dos seguintes equipamentos obrigatórios:
·
Mochila da hidratação
·
Manta térmica
·
Apito
·
Corta vento
·
Lanterna de cabeça
Antes de entrar no funil de largada
O clima entre os atletas era muito legal e animado,
como minha intenção não era de disputar muito, não quis me posicionar lá na
frente de todos e preferi ficar do meio para trás.
Animação dos atletas pré-largada
Exatamente às 4h da manhã foi dada a largada ao 1º Endurance Challenge Brasil!
Largada da prova
Como eu sabia que por volta do KM 5 entraríamos num
single track, não quis largar muito
tranquilo e fui seguindo num ritmo que passava vários atletas, a fim de não
ficar preso com o trânsito nas trilhas.
Uma passagem pelo um rio gelado, com o auxílio de
uma corda marcava o ponto de início do single
track, estava com 29min de prova e tinha uma pequena subida e depois uma
longa e difícil descida, visto que parecia ser uma trilha aberta (não muito
aberta) para a prova (talvez uma trilha com pouco uso) e com muitos galhos e
troncos atravessados, pedras e outros obstáculos, tudo isto na escuridão da
madrugada. Fiquei sabendo depois que alguns atletas se machucaram neste trecho,
eu tive muito cautela e preferi diminuir bem a velocidade, mas ainda tomei uns
pequenos tombos, sem gravidade, já tinha ido para o pelotão mais à frente e
agora só poucos atletas mais lentos estavam à minha frente e conseguia os
passar mediante solicitação, coisa que quem estava no grupo bem mais atrás não
teve, pois muitos atletas falaram que perderam muito tempo por lá, devido ao
trânsito na trilha. Infelizmente tem atletas que sabem que vão mais lento e
querem largar mais à frente, porém também é errado quem quer ir mais rápido e
larga muito para trás.
Primeira seção de single-track da prova (KM 6)
Após quase 4 Km de descida de single track saímos num pasto, ainda na escuridão, olhava para
frente e via alguns atletas, dois ou três no visual pelas suas lanternas, atrás
vinham mais alguns, tentava não errar o caminho, pois o pasto não possuía uma
trilha bem marcada e tinha vários rios. Não sei como mais em certo momento entrei
em um charco com água até a cintura e via que o atleta da frente a mais de 50
metros de mim ainda estava dentro dele, fomos seguindo pela água e com muitas
pedras, vi o atleta à minha frente caindo umas duas vezes e diminuí mais um
pouco para também não cair. As fitas sumiram e quando me dei conta elas estavam
à esquerda, acima na trilha, nós tínhamos saído dela e entrado no charco
paralelo. Gritei para frente que ia sair dali e alguns atletas me acompanharam
e achamos a trilha. Não corremos a mais com isto, só ficamos dentro da água sem
necessidade.
Final do trecho de mata antes do Aid#1 (KM 10)
Segundo o Course
Guide da prova o primeiro Aid Station (Aid#1), seria no KM 9,4
porém o mesmo só veio no KM 12,2 e
passei por lá com 1h35min. Achei estranha
esta diferença, dei um confere com outro atleta e em seu GPS marcava o mesmo que o meu, tudo bem, peguei uma paçoca e segui.
Agora tínhamos um trecho de uns 500 m de asfalto
para depois seguir por uma estrada de terra por uns 3 Km até a entrada para uma
nova trilha. Estava com 1h56min de prova e a penumbra do dia começava a
aparecer.
O Aid#2 era para ser no KM 16,7 mas
ele veio no KM 18,9 com 2h18min de prova.
O caminho foi seguindo já na primeira grande subida
da prova. Era uma subida em single track
de 5 Km. Subi com auxílio de meus bastões, porém a vegetação da trilha
atrapalhava bastante eles. Chegando ao topo agora tinha uma descida de 1,5 Km
até o Aid#3, que era para estar no KM 23,9 mas foi no KM 24,9. Cheguei lá com 3h26min. Lá se encontrava o Hard
Cutoff#1 que tinha o limite
de 4h20min de prova e muitos atletas ficaram por ali mesmo, por terem chegado
depois. Guardei minha head lamp. Também
estava previsto aqui a checagem de equipamento obrigatório para todos,
perguntei e disseram que estava sendo feito aleatoriamente. Comi pão tipo Bisnaguinha molhado na sopa, enchi
minhas garrafas e guardei meus bastões na mochila.
Seguiu-se uma descida na qual eu comecei a somente
avistar fitas azuis que era do percurso de 50K, antes sempre tinha as azuis e
as laranjas (dos 80K) juntas. Fiquei com receio de ter errado o percurso, pois
sabia que por ali teria a divisão dos percursos, mas como estava numa decida
íngreme não quis subir de volta, parei um pouco para ver se vinha alguém de
trás, mas nada. Segui descendo e avistei um staff,
chegando nele perguntei se estava certo, mas ele não me entendeu, era americano
e falei com ele em inglês e ele me confirmou que estava certo e que já tinham
lhe avisado que estava sem fita laranja neste pedaço. Ele anotou meu número e
segui por um trecho em asfalto. Um pouco mais à frente estava finalmente a
divisão dos percursos, bem sinalizada e com vários staffs. O trecho seguia plano até a entrada para a Pedra Selada com uma subida de quase 1
Km até o Aid#4 que seria no KM 30,4 mas foi no KM 32,2. Cheguei ali com 4h15min
de prova e o sol já se mostrava bem, bebi Coca-cola
e peguei novamente meus bastões para esta dura subida de mais 2,5 Km.
Início da dura subida para Pedra Selada (KM 33)
A subida piorava quando ia chegando mais perto do final e tinha até trecho com cordas para auxiliar na subida.
Foi dureza mesmo! (KM 34)
Ao final da
subida sentei rapidamente e guardei meus bastões, pois a descida de quase 7 Km prometia
ser tão dura quanto a subida – e realmente foi. Novamente uma trilha muito
íngreme parecendo que foi aberta para a prova, cordas auxiliavam nesta descida
e acabei tomando um tombo, até de leve mais que fez um corte fundo em minha mão
direita. O sangue não parava de descer, mas não parei e segui assim mesmo.
Depois de um longo trecho de single track
perigoso a trilha foi abrindo, porém continuava íngreme e com muitas pedras,
dificultando em muito a descida. Comecei a sentir um pouco de câimbras na
posterior da coxa e outro atleta me ofereceu pastilhas efervescentes de
eletrólitos e me deu o tubo com várias pastilhas para eu levar, pois ele tinha
extra. Cheguei numa velha casa que
servia de Aid#5, era para estar no KM 38,5 mas foi no KM 40,7. Ali era o Hard Cutoff#2 que tinha o limite de 6h59min de prova
e eu cheguei com 6h01min. Falaram-me
que eu estava entre os 30 primeiros e neste momento percebi que muitos atletas
não chegariam ali em mais 58min. E foi o que realmente aconteceu e a maioria
dos atletas dos 80K não passou dali.
Continuei no percurso, que seguia descendo com
muitas pedras por um pouco mais de 1 Km.
Logo em seguida chegamos à última grande subida da
prova, de 5 Km, esta era em estrada de terra bem larga e começava um pouco
tímida mas depois se acentuava bem, se mostrando bem dura neste ponto da prova.
Mais uma longa subida (KM 46)
Após a subida, iniciava uma descida leve de uns 2,5 Km até o Aid#6
que seria no KM 47,0 mas acabou vindo só no KM 50,5 com um posto bem abastecido e com o pessoal atencioso, só
faltou algo gelado, pois estava tudo quente e o sol ficara forte, estava com 7h26min de prova, no entanto uma fonte
de água gelada serviu para refrescar o corpo.
Agora a prova seria de predominância plana, sem
grandes montanhas iguais as anteriores. Eu particularmente numa Ultra Trail não
gosto de trechos planos na parte final da prova, acabo ficando sem muito
estímulo e perco tempo, já nas subidas ou descidas consigo desenvolver bem.
Cheguei ao Aid#7, que na verdade era um carro
da organização só com água e Gatorade
em temperatura ambiente, era para ser no KM 57,9 mas foi no KM 60,2 com 8h40min de prova. Queria algo salgado, fui ansioso para tomar um
pouco de sopa que caiu bem antes, mas eles não tinham nada salgado e era o que
eu precisava, sentia uma baixa na pressão arterial, tinha feito uma programação
completa com minha nutricionista, mas como não foi seguidos os itens das Aid
Stations isto fez falta, sobretudo nos itens salgados.
Continuava o trecho de predominância plana e
cheguei ao Aid#8, que também era outro carro da organização, bem no ponto
onde o percurso de 50K juntava com o de 80K novamente, este deveria ser no KM
66,0 mas veio no KM 68,7 com 9h48min de prova.
Agora tínhamos uma subida de 1,5 Km e o percurso
teria algumas subidas e descidas menores, alternando com alguns pontos planos.
Encontrei um atleta que desistira dos 80K e
esperava resgate, parei rapidamente para ver se ele precisava de algo, mas ele
estava acompanhado de um staff e
disse que estava bem, acabando ele me dando uma lata de sardinha, que eu dividi
com outro atleta que corria comigo, foi excelente, pois precisava mesmo de algo
salgado.
Estava com um incômodo grande nos pés, devido ter
passado por muitos rios e tinha várias pedrinhas dentro das meias que me
machucavam a um bom tempo. Passei por um staff
que disse ser do local e segundo a indicação dele fiz umas contas e percebi que
a prova iria acabar entre 89 e 92 Km, por isto decidi fazer uma parada para
ajustar meus pés para não dar um problema maior. Tinha levado um par de meias
reservas e troquei, que deu um alívio bom nos pés.
Mais um trecho de single track rumo ao fim da prova (KM 75)
O Aid#9 seria no KM 74,0 mas chegou
depois de um topo de uma pequena montanha no KM 77,2 e encontrei alguns atletas dos 50K e alguns do 80K, todos
reclamando que a distância estava maior e que os postos não tinham nada, só
olhei rápido, me abasteci e segui descendo a montanha. Ali seria o Hard
Cutoff#3 que tinha o limite
de 13h26min de prova e eu cheguei com 11h23min.
Fui seguindo, encontrando outros atletas e no KM
80,4 encontrei outro posto com 11h55min de prova, este não era um Aid Station previsto mas tinha algumas
coisas para os atletas, até comi um pouco de batata chips e segui, passando alguns atletas a mais dos 50K.
Mais um trecho com algumas ondulações e cheguei em
fim ao Aid#10, o último, era para ser no KM 78,0 mas só chegou no KM 84,1 com 12h27min de prova. Era na saída para o asfalto, abasteci e fui
embora, olhei para trás e vi outro atleta dos 80K chegando e decidi que ninguém
iria me passar e acelerei pelo asfalto.
O trecho ainda tinha umas ondulações, mas segui
firme em busca da linha de chegada.
Nos últimos quilômetros entrávamos em várias
trilhas técnicas com erosões e bastante lama e travessia de rios. Segui
determinado e passei vários atletas dos 50K.
Com 13h de prova peguei de volta minha head lamp e apesar de ainda estar claro
a liguei e coloquei na cabeça, seguindo o regulamento que obrigava a fazer esta
ação.
Uma última travessia de rio bem largo e com uma
corda marcava o início do balizamento para a chegada, o púbico gritava e subi
para a reta de chegada, cruzando a linha de chegada com 13h16min21seg e 89,71 KM, finalizando minha 36ª Ultramaratona.
FINISHER!
Como avaliação da prova concluo que a mesma teve inúmeras falhas, porém a organização se empenhou muito nesta primeira edição desta grandiosa prova e os pontos positivos superaram os negativos. No ano que vem com certeza a prova será muito melhor.
Agradeço sobretudo especialmente para esta prova aos parceiros que confiaram em mim mais uma vez:
E um parabéns especial para minha esposa Nilce Marcelino, concluindo sua primeira Ultramaratona (EC 50K):
Parabéns meu amor!
Até a próxima meus amigos!
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10 comentários:
Parabéns, Marcelino, a você e a Nilce pela prova. Muito legal ler seus relatos sobre as ultras. Sou paulistana, corro em uma assessoria daqui e pretendo estrear em ultras no próximo ano, no solo Bertioga/Maresias. Comecei a pesquisar ultras agora e seus posts foram os primeiros que li.
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